A Justa Medida Aristotélica e o Problema da Lógica

Aristóteles percebeu com clareza que um processo simples de determinação do que é moderado não seria capaz de promover uma concepção de justa medida eficaz, razão pela qual ela soçobraria numa medianidade perigosa e irreal (ou, o conhecido “meio-termo”);
“De tudo que é contínuo e divisível é possível citar uma parte maior, menor ou igual, e isto tanto em termos da coisa em si quanto em relação a nós; e o igual é um justo meio entre o excesso e a deficiência. Por justo meio entende-se aquilo que é eqüidistante em relação a cada um dos extremos, e que é único e o mesmo em relação a todos os homens; o justo meio em relação a nós significa aquilo que não é nem demais nem muito pouco, e isto não é único nem o mesmo para todos. Por exemplo, se dez é muito e dois é pouco, seis é o meio-termo, considerado em relação ao objeto, pois este justo meio excede e é excedido por uma quantidade igual; este é o justo meio de acordo com uma proporção aritmética. Mas o justo meio em relação a nós não deve ser considerado de maneira idêntica. [...] Sendo assim, um mestre em qualquer arte evita o excesso e a falta, buscando e preferindo o justo meio - o justo meio não em relação ao próprio objeto, mas em relação a nós. [...] Estou falando da virtude, pois é esta que se relaciona com as emoções e ações, e nestas há excesso, falta e justa medida”. (EN, II, 6, 1106a 25 – 1106b 15)
Esta interpretação valida-se como uma transliteração homeomórficamente equivalente do conceito de justa medida, tal como realizaram os chineses; situa-se no problema da adequação, que reconhece os seres como possuindo diferentes potenciais e necessidades, o que conseqüentemente desloca o ponto ideal de moderação de acordo com estas condições (ou propensões) e modela a virtude, tornando-a ao mesmo tempo o modelo da medida correta;
“Sendo então as disposições morais opostas umas às outras, o maior grau de oposição é o existente entre os dois extremos, e não entre cada extremo e a centralidade, pois os extremos estão mais afastados entre si do que cada um deles em relação à centralidade, da mesma forma que o grande está mais longe do pequeno e o pequeno do grande do que ambos estão do médio. Ademais, alguns extremos apresentam uma certa semelhança em relação à centralidade, como no caso da temeridade em relação à coragem e no da prodigalidade em relação à liberalidade, mas é entre si que os extremos apresentam a maior desigualdade; tanto é assim que os contrários são definidos como as coisas mais afastadas entre si, de tal forma que quanto mais afastadas estão as coisas, mais contrárias elas são. Em relação ao justo meio, em alguns casos é a falta e em outros é o excesso que está mais afastado; por exemplo, não é a temeridade, que é o excesso, mas a covardia, que é a falta, que é mais oposta à coragem, e não é a insensibilidade, que é uma falta, mas a concupiscência, que é um excesso, que e mais oposta à moderação. Isto acontece por duas razões; uma delas tem origem na própria coisa, pois por estar um extremo mais próximo ao meio-termo e ser mais parecido com ele, opomos ao intermediário não o extremo, mas seu contrário”  (ibidem, II, 8).
Mas o que diferenciará o ponto de vista grego do chinês resulta, pois, deste aspecto final da aquisição da justa medida. Como vimos, o pensar chinês é processual, se guia por procedimentos adaptativos, e acopla o problema da exatidão a uma estrutura onde a mutação é a reguladora do processo gerativo. Aristóteles, porém, estava inserido numa outra perspectiva que privilegiava a relação entre o pensamento lógico-matemático com a realidade fenomênica; ele não podia admitir que a justa medida pudesse sofrer os tais “deslocamentos contextuais” (em relação ao caráter da ação) que caracterizam a possibilidade dialética existente na proposta confucionista. Ambos os autores parecem, pois, se encaminhar na mesma direção, excetuando precisamente esta última questão; e é ela que investigaremos agora.
 
A Aquisição pela lógica formal e o problema da fixação do ponto justo
Ainda que o mestre grego pudesse vislumbrar o problema da adaptabilidade, a formulação de justa medida, em sua concepção, articulava-se num único ponto correto, que é o justo, a centralidade;
“Não e fácil determinar racionalmente até onde e em que medida uma pessoa pode desviar-se [da centralidade] antes de cair em erro; tais coisas dependem de circunstâncias especificas, e a decisão depende da percepção. Isto é bastante para determinar uma posição moderada (ou mediana? N.A.) que deve ser louvada em todas as circunstâncias, mas às vezes precisamos inclinar-nos no sentido do excesso ou da falta, para assim atingirmos mais conscientemente o a justa medida e o soberano bem” (EN, II, 9, 1109b 20/25).
Este justo é sempre o mesmo (pois é a virtude constituída) mas é variável em intensidade, segundo a necessidade de adaptar-se aquele que a busca e a pratica. Ainda assim, o justo tem de ser um, porque é moral e é mutuamente reconhecido;
“Há também, da mesma forma, excesso, falta e justo meio em relação às ações. Ora: a virtude se relaciona com as emoções e as ações, nas quais o excesso é uma forma de erro, tanto quanto a falta, enquanto o justo meio é tido como um acerto; ser tido e estar como certo são características da virtude. A virtude, portanto, é algo como a eqüidistância, pois, como já vimos, seu alvo é o justo meio. [...] É por isto que o excesso e a falta são características da deficiência moral, e a virtude caracteriza o justo meio é, pois “a bondade é uma só, mas a maldade é múltipla”. A virtude, então, é uma disposição da alma relacionada com a escolha de ações e emoções, disposição esta consistente num justo meio (o justo meio relativo a nós) determinado pela razão (a razão graças à qual um homem dotado de discernimento o determinaria). Trata-se de um estado intermediário, porque nas várias formas de deficiência moral há falta ou excesso do que é conveniente tanto nas emoções quando nas ações, enquanto a virtude encontra e prefere o justo meio. Logo, a respeito do que ela é, ou seja, a definição que expressa a sua essência, a virtude é um justo meio, mas com referência ao que é melhor e conforme ao bem ela é um extremo” (ibidem, 1106b 15/35).
Neste ponto, portanto, Aristóteles busca articular à justa medida um sistema que possa assegurar sua inferência de modo preciso; “É necessário, porém, não somente chegar a esta definição de ordem geral, mas também aplicá-la aos fatos particulares, pois entre as definições referentes à conduta as mais gerais têm uma aplicação mais ampla, mas as particulares são mais verdadeiras, já que a conduta tem relação com casos particulares, e nossas definições devem compatibilizar-se com tais casos” (II, 7, 1107a 30). Este sistema é a lógica matemática, capaz – para ele - de determinar o ponto onde a virtude é atingida, e o procedimento mais adequado para tal (a mensuração das tensões dentro de uma leitura igualmente única e acessível a todos).
Sua resposta para o problema da adaptabilidade aparece na idéia de “proporcionalidade” resultante da injunção da justa medida através de uma média aritmética[1] entre os meios de aquisição das virtudes. Esta proposta de análise se consigna de fato no livro V (EN, V, 1131a 15/30 – 1131b 5/20) - embora apareça brevemente no Livro II (8, 1108b 10/15). Sua inferência pressuporia a existência de quatro elementos integrados numa equação; a noção de ser justo, o excesso, a falta e a sua aplicabilidade. Com a conjunção destes elementos, se determina um justo que seja devidamente proporcional e eqüidistante aos fatores sobre os quais se aplica, de acordo com um princípio de justiça distributiva que leve em conta a variablidade daqueles aos quais se aplica, e o contexto em que se encontram. Tal formulação permitiria, para Aristóteles, a determinação deste ponto correto de justa medida – e, concomitantemente, a sua fixação. Ainda que ele possa se regular por entre os indivíduos de modo diferenciado, ou segundo a circunstância, sua essência – a moderação – se situaria num único arranjo aplicável a todos os indivíduos. É, por conseguinte, um método que prescinde de qualquer recurso subjetivo, senão a habilidade e a racionalidade distributiva; e evita, ainda, o problema da Não-contradição, proporcionando a exclusão das variáveis - duas das regras fundamentais do modelo lógico aristotélico.[2]
Eis então a consideração que gerará inúmeros problemas aos leitores posteriores da filosofia grega, e que foi apontada por Jullien (SBI, 36); ao conceber que a centralidade pode ser inferida por um método pragmático, a sua obtenção prescinde da sabedoria e passa a ser tratada como um recurso eminentemente prático, tal que se baseia numa ação que pode ser aferida e raciocinada. Por conseguinte, ela adquire um caráter estrito – fundamentado no real, e para o real – que subtrai o subjetivismo de sua composição.
Este discurso lógico-formal, que caracteriza a filosofia grega, é o ponto onde se desdobra e se diferencia a leitura interpretativa do conceito de justa medida; embora os chineses conhecessem o método, decidiram-se por não empregá-lo, acreditando que ele fixaria, justamente, aquilo que não pode ser  regulado de uma forma arbitrária. Ao propor a adaptabilidade processual, negam que a lógica formal possa servir diretamente ao problema dos seres, senão quando condicionada estritamente às funções práticas para as quais ela serve de auxiliar (razão pelo qual eles se tornaram tão bons matemáticos quanto os gregos, e no entanto, nunca conceberam o uso da geometria ou da aritmética senão como um recurso aos problemas da matéria). O que Aristóteles fez - determinar um ponto axial para onde a justa medida se desloca e se afirma como única - causaria incômodo aos chineses, para quem não se podia nivelar de modo singular aquilo que é plural (os seres) senão por um sistema referencial ou estrutural. A eqüidade se diz ao gênero, e não ao espécime, segundo os confucionistas; fixar então um ponto significa abstrair uma condição não existente, que – ainda que seja proporcional – redunda numa medianidade (ou, o temido meio-termo) e não numa correta moderação.
Quando afirmamos, também, que o problema da articulação entre a lógica formal  e a justa medida incomodava aos chineses, não nos remetemos a um possível contato destes com o pensamento aristotélico em tempos ermos; os orientais tiveram suas experiências em tentar relacionar ambos os processos, mas as recusaram. Esta experiência com a lógica foi compartilhada na China por várias escolas, mas desenvolveu-se principalmente na doutrina chamada de Moísta (ou Mozista), tida como uma das principais rivais dos letrados e capitaneada por um líder carismático chamado Mozi.[3]
Os moístas foram, talvez, os únicos a tentarem realizar esta fusão entre a lógica-formal e a justa medida. Embora se afirme que o conhecimento de lógica entre os chineses não tenha atingido um nível de desenvolvimento profundo (Chan, 1978b), tal afirmativa não parece se estabelecer, tendo em vista que até recentemente sabíamos muito pouco (e mal) sobre o assunto (Hansen, 1983).[4] Confucionistas e daoístas pareciam conhecer igualmente alguma coisa sobre este sistema, mas preferiram não utilizá-lo. Por que isso se deu? A resposta está situada dentro do próprio sistema do pensar chinês, como temos analisado até agora; pautando-se na cosmologia, os confucionistas reconhecem a geração processual, e por conseguinte, a mutação e a variabilidade, focando a constituição de um sistema ciclicamente renovável de ação; em contraposição, os moístas eram os principais defensores de uma ética universalista redundante, onde todos os seres humanos seriam iguais (seriam proporcionalmente iguais, posto que eram diferentes, mas suas propensões são ajustáveis) o que, conseqüentemente, forçava a estruturação de um sistema que fixasse os pontos axiais das medidas humanas.
Fixando-os, tais pontos constituiriam o fundamento da ação, e determinariam a priori a modulação da virtude. Ou seja, os moístas não propunham atingir uma moderação pela experiência, mas sim pelo estabelecimento de uma possível “medianidade” que levasse em conta, no entanto, o conhecimento da moderação. Neste momento, pois, os moístas fizeram progressos seguros em direção ao método formal - aristotélico de premissa, prova, hipótese, etc...(ibidem Hansen, 1983) e se distanciaram em definitivo dos seus concorrentes. No entanto, o desenvolvimento da relação ética-lógica formal esmaeceu muito rapidamente na própria antiguidade chinesa. Provavelmente, o principal elemento que serviu para interromper a seqüência de desenvolvimento desta linha foi a contradição não resolvida com a cosmologia processual chinesa e a questão da sabedoria. Afirmando uma exatidão perene e alheia ao processo gerador da natureza, os moístas formularam um tipo de resposta (a precisão formal) que soava artificial e pouco prática em relação a diversidade dos seres – embora sua proposta fosse justamente contrária. Além disso, como eles poderiam assegurar a existência de uma única sabedoria se a própria variabilidade de idéias (e pessoas) demonstrava o contrário? Não sendo então “eficaz” (ou seja, não obtendo uma clara eficácia em seus procedimentos aplicativos), a linhagem moísta não se desdobrou senão por entre os grupos menos intelectualizados da sociedade ou, na ciência chinesa (onde sua presença foi mascarada pela forte influência de uma outra escola, a dos “cosmológicos”), e terminou por implodir, não sustentando suas bases conceituais e metodológicas.
Como afirma F. Jullien,
“Falta responder à pergunta; por que a racionalidade mozista, afinal de contas, não conseguiu se desenvolver? Pois é forçoso constatar que ela desaparece com o fim da antiguidade chinesa (-221 a.C.) e que os textos de seu corpus chegaram até nós em farrapos; foi somente no início do século XX que, descobrindo a lógica ocidental, os chineses voltaram a se interessar por ela. Durante mais de dois milênios ela permaneceu escondida. Não que a tenham combatido, mas ela se viu marginalizada e caída no esquecimento; numa palavra, ela não “pegou” – nem afirma sua consistência (como se diz que uma massa pega), nem busca seu crescimento (como uma planta pega). Questão ao mesmo tempo de coerência interna e de meio reencontrado: aquela assegurando à configuração teórica a coesão que lhe permite tomar corpo e se impor, este permitindo-lhe arraigar-se e implantar-se. Se ela não “pegou”, é que certa globalização não se pode realizar (sob a qual o fenômeno permanece esparso e pende para o seu estiolamento). Prova disso o fato de que, se conceberam o verdadeiro por “adequação” objetiva ou por “legitimidade” lógica, os chineses nunca pensaram, nem mesmo os mozistas, uma noção unitária e global, da verdade. Eles nunca buscaram a verdade (e a noção desta foi traduzida no Ocidente). Por isso, a esse escondimento da racionalidade mozista, não se poderia dar uma explicação simplesmente sociológica, como Graham (1987) tentou fazer, mesmo se tal explicação também for verdadeira: os mozistas se formaram nos meios dos artesãos, e não de conselheiros da corte, como os confucianos, o que esclarece o seu interesse por tudo o que pertence à medida, bem como pelo que chamaríamos de técnica; mas, ao mesmo tempo, isso os tornava passíveis do desprezo que manifestou por esse tipo de saber a classe dos letrados-funcionários que, antes mesmo do aparecimento do império, começou a se impor na China. Tampouco podemos nos ater às razões mais geralmente alegadas, sejam elas lingüísticas ou históricas; nem à dificuldade que o chinês encontraria para formar conceitos, pois está claro que o pensamento chinês soube elaborar seus marcadores de abstração; nem a censura exercida por um poder autoritário, porque, no fim da antiguidade, a China está dividida em principados rivais entre os quais o pensador chinês pode evoluir, no fim das contas, tão livremente (como “conselheiro” itinerante) quanto o filósofo grego entre as cidades. As razões disso seriam, portanto, ao menos em parte, internas ao pensamento – e é isso que as torna interessantes para a filosofia: se o fato de que o mozismo não se pega trai uma resistência à filosofia, essa resistência mesma só é completamente explicável a partir de uma orientação inversa, manifestando-se em reação, que é a de uma anti-filosofia.[...] De fato, nesse debate eles (os principais pensadores da época) vêem tão somente uma cilada. Porque, constrangendo-os à polêmica, ele os desvia do essencial: agarrando-se à argumentação, fixando-se na verdade, passar-se-ia ao largo (do “isso” a realizar). Antifilosofia que se revelou suficientemente coerente, e consistente, por conseguinte, para barrar o caminho o da filosofia – esta se viu travada nele; e foi por ela que a sabedoria “pegou” (SBI, 97-9).
Portanto, embora o método aristotélico (e analogamente, o moísta) pudesse ser validado entre os chineses (por partirem de um mesmo conceito, que pode ser inferido por todos), possivelmente esta última leitura sobre a aquisição da justa medida lhes soasse estranha, por buscar regular o mutável por um processo fixador. Divergindo ainda do guia da sabedoria completa (sheng), os moístas singularizam-se entre seus compatriotas, visando tão somente um saber prático tido como incompleto; Aristóteles, porém, livre destas amarras, dá ensejo à teorização da medida aritmética e da proporcionalidade, podendo completar o circuito da aferição da medida pela lógica formal.
De qualquer forma, isso não impediria que a justa medida aristotélica descambasse para uma vulgarização do “meio-termo” nas leituras que se fariam dela posteriormente no Ocidente. A dificuldade central que existe na proposta de articulá-la a uma coordenada formal reside, como nos mostra Jullien, na brecha aberta entre o problema da adequação dos seres e a formulação de uma regra de mensuração; baseando-se nisso, o que vem a constituir o trabalho filosófico, neste caso, aliena o aspecto subjetivo (a experimentação, a avaliação da experiência, a formação do saber, o preparo, etc) e tenta delinear um método centrando esta subjetividade em sua própria formulação. Fecha-se então um círculo, onde o caráter prático teoricamente se superpõe à “inteligência pautada na sabedoria”, e a modelação da virtude retorna a uma constituição arbitrária.[5] “[..] A excelência moral é assim porque sua característica é visar as situações intermediárias nas emoções e nas ações. Por isto, ser bom não é um intento fácil, pois em tudo não é um intento fácil determinar o meio” (II, 9, 1109a 20/25), disse o Mestre grego. Ele estava correto, principalmente quanto aos seus comentadores...
 
A saída Confucionista
A saída dos confucionistas para o problema da inferência da justa medida reside justamente, pois, nesta negação à aplicação de um recurso tecnicamente fechado e formal – ou ainda, estatístico – para auferir uma medida que se encontra referencialmente estabelecida na virtude, mas que se manifesta mutavelmente por entre os seres.
Teoricamente, ao privilegiar a sabedoria como fundamento e guia no processo de experimentação e percepção do justo meio, os chineses esperavam manifestar o principio da virtude subjacente ao caráter da ação, enquadrando-o numa categoria perceptível de ações que poderiam ser consideradas moralmente corretas e medidas. Anulariam, assim, o problema de se cair numa relativização completa das morais – ainda que admitissem sua pluralidade – constituindo a idéia de que a propriedade essencial das virtudes encontraria-se imanente na formulação dos raciocínios éticos.
A sabedoria completa (sheng), portanto, se definiria como um estado intelectual e ético que se englobaria toda a vivência das necessidades práticas na qual se constrói a excelência moral, experienciadas através de um aparato ideal para a mensuração das tensões existentes nas ações morais, nas virtudes, por meio das quais se constituiria o arcabouço fundamental da experiência humana. Adquirida, possibilitaria ao ser (o sábio) decodificar o mundo através da observação dos princípios imanentes nas coisas, analisar suas perspectivas, definir o meio adequado de adaptação a um contexto de vida, inferindo o melhor meio de adaptar-se a ela sem perder-se.
Tal característica adaptativa é que provavelmente permitiu à concepção chinesa reformular-se continuamente – sem, no entanto, perder seus princípios delineadores – através dos séculos, propiciando à obra de Confúcio uma revitalização constante que lhe propiciou um processo único de continuidade em toda a história do pensar humano. Evitando fixar-se nas regras de um mundo que sempre muda, Confúcio permaneceu.


[1] Aristóteles a chama, no entanto, de proporção geométrica.
[2] Sobre a lógica aristotélica, ver o trabalho de Lukasiewicz, J. La Silogística de Aristóteles. Madrid: Tecnos, 1977.
[3] A Vida de Mozi é pouco conhecida, mas seu período de vida teria transcorrido entre os séculos V-IV, aproximadamente sessenta anos após o período de vida de Confúcio. Ver Fung, Y.L. “The Origin of Ju and Mo” in Chinese Political and Social Science Review.Beijing: Tsinhua University, 1935. Neste Artigo, Fung compara o surgimento de ambas as escolas quanto as suas perspectivas teóricas, principalmente em relação aos seus objetivos éticos e políticos.
[4] Chang Tung Shu (Chang, 1977) faz uma explanação abrangente sobre o problema da linguagem e da estrutura lógica na China e no Ocidente em um longo artigo intitulado A Teoria do Conhecimento de um Filósofo Chinês. Hansen (1983) recupera e analisa o seu texto, criticando-o, porém, por não dedicar-se especificamente as categorias chinesas de linguagem.
[5] D. Murcho afirma que a Lógica aristotélica possuía falhas sistêmicas que podemos, oportunamente, vislumbrar nas brechas onde ser insere o problema da relação medida-lógica. Sobre o tema, ver Murcho, D. Lógica, Aristóteles e o Vazio. Portugal, 2005 in www.criticanarede.com